quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Oblivion - I

Foi uma longa manhã, tentei concentrar forças e obviamente não consegui. O mundo lá fora é vil, e tem horas que não quero compartilhar além do mais as pequenas coisas são as que mais ferem. Talvez, que por um momento, seja que tu esperas no mínimo que sejas tratado tal como trata, e na verdade tu não espera mais nada. Bem como uma casa velha com móveis novos. Tu encaras a mesa, ela sofreu e as ataduras nos seus pés não são para fins estéticos. Funcionalismo - é o que dizes.
O tempo vai corroendo a mesa, essa que poderia ser "viva", obviamente não se auto-conserta. Tentas fazer alguns reparos, espera a resposta alguma mudança quem sabe. Mas a velha tábua sobre pernas de aço com ataduras mal fica em pé sem balançar. Colocas a comida ali, tua prancheta e ela segue a balançar. Em algum longíquo instante tu chegas a acreditar que no outro dia a mesa não vai ficar em falso. E isso segue até um belo dia, e tu passeando pelo complexo comercial vê uma nova mesa, mas tu tens apego àquela mesa. Então, deixas passar um tempo, e o teu instinto diz "chega de derrubar café e estragar teus desenhos". Finalmente tu compras a mesa nova, e aí tu pensas "Agora está tudo certo.".
Até que a pia racha em duas...

Um comentário:

Fernanda Rodrigues Barros disse...

Já li e reli tantas vezes este teu 'oblivion' que embarquei além das figuras de linguagem e retornei ao dito definido e jogado com extrema violência numa face frágil. "...essa que poderia ser 'viva'..." - e se a árvore martirizada e depois morta tivesse sido outra que não esta da mesa? e se, como o mafra escreveu.. a mesa ainda guarda a lembrança da madeira sendo cortada, picotada e depois transformada num móvel? e... bem sabemos que não quis dizer somente que "o tempo vai corroendo a mesa" mas também que o mesmo tempo corrói (com todas as suas traças) a existência e muitas vezes o objeto inanimado resiste (mesmo com suas pernas bambas) e "vê" a morte de muitos de seus humanos donos.

A espera de que muito do que está 'em falso' em nossas vidas, assim de repente, num outro dia que chega naturalmente, possa mudar sem muita explicação, que apenas mude, se transforme em qualquer outra coisa, menos na 'coisa quebrada, em falso, aquilo que faz escorregar os objetos colocados sobre a mesa'. A espera. Por que pensar depois que foi em vão? Se tudo ficou como estava ou se nada se transformou ou ainda se se transformou em coisas totalmente inesperadas ou em coisas muito piores... a espera de algo que não ocorre exatamente como se queria já fala por si e ao menos existiu num sentir de alguém. Já teve valia ainda que não realizada.

A mesa substituta faz a pia mostrar que chegou a vez dela de ser encarada como está ou de ser trocada por uma nova. A pia rachada é a resposta da mesa bamba que deveria ter ficado "derrubando cafés e estragando (não-estragando) os desenhos". A revolta da pia. O lamentar da troca. A memória que nunca se perde, pois mesmo que o objeto não seja mais visualizado pelos olhos, pelos sentidos jamais deixará de ser.

Apenas divagando.. é o que bons textos fazem comigo!